“Um Festivus para o resto de nós!” O feriado criado na série Seinfeld pelo excêntrico Frank (Jerry Stiller), pai de George Costanza (Jason Alexander), para se contrapor ao aspecto mercantilista do Natal tem evidente intuito cômico. Ainda assim, reflete a realidade de muita gente que não celebra a data cristã por questões religiosas ou convicção pessoal.
Seja qual for a motivação, essa escolha não é obstáculo para embarcar no clima do fim de ano e fazer uma maratona de filmes. A seguir, listamos opções em gêneros como comédia, romance, ação, fantasia e drama que não têm nada de Natal, mas são um verdadeiro presente.
Família reunida
Um dos apelos de Esqueceram de Mim (1990) é o fato de concretizar a fantasia infantil de viver (ao menos por alguns dias) de acordo com as próprias regras. Uma grande alternativa de filme sobre a realização de um sonho de criança – e, neste caso, sem qualquer referência natalina – é Cinema Paradiso (1988).
Na trama, um bem-sucedido cineasta é informado da morte de seu velho mentor; ele então passa a recordar a infância em uma cidadezinha no interior da Sicília, período em que descobriu o gosto pelo cinema e aprendeu o ofício de projetista com Alfredo (Philippe Noiret). O pequeno Salvatore (Salvatore Cascio) se revela tão astuto quanto Kevin McCallister (Macaulay Culkin), mesmo sem precisar enfrentar nenhum ladrão. No final, há um reencontro tão emotivo quanto o de Kevin com a mãe – embora aqui ele seja agridoce e bem mais eficiente na indução de lágrimas. Uma carta de amor do diretor italiano Giuseppe Tornatore à Sétima Arte.
Fogos de artifício
Todo ano, ressurge o debate questionando se Duro de Matar (1988) é um filme de Natal ou não – a despeito de seu diretor, John McTiernan, já ter esclarecido que sim, sem dúvida é.
Dito isso, é tarefa difícil encontrar alternativa para o longa estrelado por Bruce Willis, perfeito em todos os aspectos. Operação Invasão (2011) é um excelente candidato: não tem referências natalinas nem a noção de “exército de um homem só”, mas tem um prédio como cenário.
O enredo, simples e direto, gira em torno de um esquadrão de elite da polícia indonésia, do qual faz parte o novato Rama (Iko Uwais) e que invade um prédio em Jacarta, a fim de prender o chefão do tráfico Tama (Ray Sahetapy). Repleto de violência brutal e lutas muito bem coreografadas, o filme é dirigido pelo galês Gareth Evans, que demonstra domínio da narrativa visual: ele é capaz de criar momentos de pura tensão sem recorrer a uma linha de diálogo sequer.
Brinde a dois
Um grande elenco em tramas que se cruzam e retratam diferentes relacionamentos. Essa é a premissa de Simplesmente Amor (2003), mas também descreve nossa opção sem Natal: Nashville (1975), um dos melhores trabalhos do diretor norte-americano Robert Altman.
O longa-metragem traz outras coincidências com o estrelado por Hugh Grant e companhia; por exemplo, um triângulo amoroso, como o de Juliet (Keira Knightley), Peter (Chiwetel Ejiofor) e Mark (Andrew Lincoln), aqui formado pelo casal de cantores Bill (Allan F. Nichols) e Mary (Cristina Raines) e seu guitarrista Tom (Keith Carradine). A exemplo de Sarah (Laura Linney), há uma mulher dedicada a familiares com deficiência – Linnea (Lily Tomlin), com dois filhos surdos. Espelhando Daniel (Liam Neeson), há um marido em luto – o sr. Green (Keenan Wynn). Há até um político – não o primeiro-ministro do Reino Unido, mas um candidato à presidência dos EUA, que jamais dá as caras. O que Nashville oferece a mais é uma dose de drama e música, já que seu pano de fundo é a indústria da música country.
Fantasia e bonequinhos
Apesar de ser dirigido por Henry Selick, O Estranho Mundo de Jack (1993) costuma ser mais associado a seu produtor Tim Burton, autor do poema no qual o roteiro se baseia e criador de todo conceito visual do filme. Outra animação em stop motion que leva a assinatura de um cineasta de estilo peculiar (mas não tem temática natalina) é O Fantástico Sr. Raposo (2009), adaptação de uma novela do britânico Roald Dahl.
Assim como Jack Skellington, o sr Raposo (George Clooney) deixa o ego levá-lo a ações que prejudicam todos ao seu redor; ao longo da trama, ele amadurece, se redime e, durante o processo, consegue se reconectar com o filho, Ash (Jason Schwartzman). Além do visual impecável e do incrível trabalho de design de personagens, o filme conta ainda com os traços distintivos do diretor Wes Anderson: sua paleta de cores, seus movimentos de câmera e, claro, seus enquadramentos absurdamente simétricos.
Momento de reflexão
Inúmeras são as adaptações cinematográficas da novela Um Conto de Natal, de Charles Dickens – de Os Fantasmas Contra Atacam (1988), com sua ambientação contemporânea e tom cômico, à versão animada (2009), estrelada por Jim Carrey. Em comum, todas trazem a transformação no caráter de Ebenezer Scrooge após a visita dos três fantasmas.
Sem menções ao feriado cristão, Viver (1952) também fala sobre aprendizado: seu protagonista, o burocrata Kanji Watanabe (Takashi Shimura), descobre que está doente; no pouco tempo que lhe resta, ele tenta encontrar sentido na vida. Por fim, toma como sua última missão atender à reivindicação de um grupo de moradores: a construção de um parquinho para crianças. Com uma performance extraordinária de Shimura – são de arrancar lágrimas os dois momentos em que interpreta a canção Gondola no Uta, com diferentes motivações –, Viver também marca um dos pontos mais altos na carreira do diretor japonês Akira Kurosawa.