Ainda que nunca tenha pregado nenhuma religião, a fé é algo inerente à saga Star Wars. Mais do que um poder que torna heróis e vilões superiores, a Força permeia esse universo quase como uma entidade que concede privilégios a quem pode senti-la.
Dependendo da leitura, a Força pode representar muita coisa, e a mais forte delas é a esperança. Esse sentimento sempre ressurge como uma fagulha capaz de incendiar uma resposta aos males que parecem fortes demais para serem superados – seja na forma de um jovem de Tatooine que só sonha em ser piloto, ou de um garotinho usando poderes para brincar com sua vassoura.
Tema recorrente e muito forte na saga, a retomada da esperança é o grande trunfo do quinto episódio de Obi-Wan Kenobi. Em seu penúltimo capítulo, a série finalmente mostra a que veio ao elevar a jornada de seu protagonista enquanto responde perguntas e prepara um finale grandioso.
[Atenção, a partir daqui spoilers do quinto episódio de Obi-Wan Kenobi]
A Parte V começa com um flashback situado na época do Episódio II – Ataque dos Clones. Ele mostra um treinamento de combate entre Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor) e seu aprendiz, Anakin Skywalker (Hayden Christensen). Mais do que um aceno aos fãs que estavam ansiosos por ver a dupla reunida em um contexto amigável, o momento serve como paralelo para o novo encontro da dupla no presente.

No momento atual, o ex-discípulo Darth Vader está indo em direção a Kenobi e seus aliados no Caminho após o sucesso do plano de Reva (Moses Ingram). Por descobrir a localização do antigo mestre do Lorde Sith, ela recebe o cargo de Grande Inquisidora e a promessa de finalmente cumprir a missão.
Não demora muito para que os mocinhos percebam que o Império está atrás deles. Enquanto um destróier se aproxima, eles perdem o controle da passagem pela qual escapariam graças à sabotagem do Lola, dróide de Leia (Vivien Lyra Blair) que passou a responder aos comandos da inquisidora.
A gravidade da situação coloca os refugiados do Caminho em pânico, uma situação de crise que obriga Obi-Wan a agir. Ao ver a desesperança tomar conta do lugar, ele reencontra o espírito guerreiro e estrategista que lhe concedeu o título de General e bola um plano para atrasar os vilões sem a necessidade de um combate ao qual certamente perderiam.
Nesse ponto, Kenobi finalmente abandona a apatia que o deixava imóvel perante a crueldade do Império, cumprindo o propósito de toda essa jornada. Mais do que voltar ao confronto, esse momento mostra o Jedi voltando a ter esperança, uma mudança de atitude que respinga em cada passo ao longo do episódio – como confiar uma responsabilidade a Leia por acreditar na jovem.
Infelizmente, os vilões dispõem de uma superioridade numérica e tecnológica que os leva aos mocinhos em alta velocidade. Para ganhar tempo, Obi-Wan toma uma medida desesperada e pede para negociar com Reva. Usando a Força, ele entra na mente da jovem e descobre a verdade sobre suas motivações.
A origem de Reva
Para a surpresa de Kenobi, a jovem é uma sobrevivente à Ordem 66, o massacre Jedi ordenado pelo Imperador. Ela fazia parte dos iniciados que entraram no caminho de Anakin Skywalker, que não teve pudor em assassinar crianças ao se bandear para o Lado Sombrio. Ao contrário dos colegas, ela sobreviveu ao se fingir de morta e cresceu com o objetivo de se aproximar de Vader para se vingar.
Esse momento de fragilidade de Reva, cuja dor faz com que ela baixe a guarda e fale a verdade, ganha vida graças ao talento de Moses Ingram. A atriz toma todo cuidado para transpor a dor e a sede de vingança de sua personagem sem cair em caricaturas, o que só deixa o relato mais forte. Especialmente quando ela questiona Obi-Wan por que ele não impediu o próprio discípulo – a mesma dúvida que o tortura e paraliza há quase uma década.
A tentativa de firmar uma parceria para derrotar o Sith não dá certo e Reva prossegue com o plano e invade o Caminho. O que se desenrola na sequência é um verdadeiro cenário de guerra, com tiroteios entre Troopers e os insurgentes e seus dróides.
O conflito demonstra tanto as fraquezas quanto os triunfos da direção de Deborah Chow. Se por um lado o conflito em si parece pouco engajante ao confiar seu dinamismo a câmeras trêmulas que se tornam cansativas muito rápido, por outro ela compensa no lado dramático.
A forma como a cineasta executa o sacrifício de Tala Durith (Indira Varma) e seu dróide NED-B é comovente e transmite toda a dor de uma baixa em tempos de guerra. Um feito e tanto, considerando que nenhum dos dois personagens teve muito desenvolvimento, e ainda assim suas perdas foram sentidas. Assim, a recitação do mantra “que a Força esteja com você” ganha peso e volta a pontuar o reencontro de Kenobi com a fé.
Um resgate que dá a ele a confiança de tentar ganhar tempo em uma última parceria com Reva. Quando o plano falha, ele volta para tentar ajudar o povo do Caminho a escapar, uma fuga que começa exatamente no momento em que Darth Vader chega. Em uma exibição de poder, ele para uma nave sozinho com o uso da Força. Para a sorte dos mocinhos, a embarcação era só uma distração, usada para que uma outra nave fuja.

Nesse ponto, a ideia de Obi-Wan de que “há outras formas de lutar” além do confronto físico ganha contornos metalinguísticos. É quase como se a série justificasse ao público que a grande batalha entre Kenobi e Darth Vader não é física, mas mental. A luta verdadeira é pela alma de Ben, que vence o Lado Sombrio cada vez que se nega a desistir. É assim que um velho destreinado que sua para resgatar uma criança supera um ser poderoso que destroça naves com as próprias mãos: sendo sábio.
Após deixar seu grande rival escapar, Darth Vader tira um momento para saborear a derrota. Ele é interrompido por Reva, que tenta aproveitar o momento de distração para conseguir sua vingança. Acontece que o Lord Sith já sabia da verdade e a atitude passa longe de ser surpreendente.
Assim, Reva e Vader travam o melhor combate da temporada, em que ela parte para cima dele com um ódio cego e recebe de volta toda habilidade do Sith, que demonstra pouco esforço para desviar de seus golpes e afastá-la usando a força.
Somando uma coreografia de luta de encher os olhos e a engrandecedora direção Deborah Chow, o combate ganha um tom épico quando Darth Vader se apossa do sabre da Inquisidora, o parte e joga uma das metades aos pés dela, propondo um duelo “justo”. Mesmo com toda habilidade e velocidade, a jovem é superada e acaba esfaqueada por Anakin quase dez anos após os evento da Ordem 66.

Após atacá-la com o sabre, ele admite que já sabia das intenções dela e abre as portas para o retorno do Grande Inquisidor. Ele retorna com a teatralidade típica dos Sith para recuperar a liderança do grupo e mostrar que está vivo – algo que os fãs já esperavam, considerando a participação do personagem em Star Wars: Rebels, que se passa após os eventos de Obi-Wan Kenobi.
Sem se dar ao trabalho de matar a traidora, em uma manobra muito conveniente do roteiro, eles partem para perseguir a nave do Caminho. Enquanto isso, Reva descobre o comunicador de Obi-Wan, que mesmo avariado revela a ela que o senador Bail Organa (Jimmy Smits) está partindo para auxiliar Owen Lars (Joel Edgerton) a proteger “o garoto”.
É assim que o penúltimo capítulo arma um finale grandioso em Tatooine, onde vilã e herói devem se encontrar para decidir o destino do pequeno Luke Skywalker. Filho que Darth Vader não sabe que tem, o garoto deve ser peça chave no novo plano de Reva para ferir o novo mestre.
Resta saber como tudo isso vai se amarrar sem que o garoto conheça Leia ou mesmo Obi-Wan, pessoas com quem salvaria a galáxia quase uma década depois.
O sexto e último episódio de Obi-Wan Kenobi chega ao Disney+ na próxima quarta-feira (22).