Trek to Yomi | Review

Desenvolvido pelo estúdio indie Flying Wild Hog, Trek to Yomi é um jogo de ação e aventura, que entrega uma experiência contemplativa. Porém, ele não aproveita todo o potencial de sua premissa.

O protagonista é um espadachim que precisa proteger as aldeias e todos aqueles que ama… mesmo se tiver que enfrentar seus próprios demônios internos para isso. Esse é o pontapé inicial para colocar o jogador em um mundo de poucas cores, mas com muito sentimentalismo.

Ao todo, o título tem sete capítulos. E o objetivo é simples: avançar em cada fase, que conta com um chefe final diferente – e, às vezes, com escolhas para fazer.

“Yomi” denomina o mundo dos mortos na mitologia japonesa e no xintoísmo, e o jogo explora elementos envolvendo essa ideia

Todo o visual de Trek to Yomi conta com uma estética monocromática, além de um efeito película na tela, que simula aqueles “granulados” de filmes antigos. Esse é o primeiro traço que mostra a inspiração do jogo no cinema clássico do Japão, principalmente no cineasta Akira Kurosawa. Essa influência aparece também em outros momentos, e até afeta a trama.

A falta de cor dá destaque aos efeitos de iluminação e de clima (como chuva e ventos), que são bem executados. No entanto, a aparência dos personagens e os detalhes de objetos nos ambientes são básicos e não refletem tanto cuidado.

A característica única do jogo está na construção dos cenários. Com estrutura linear e câmeras fixas, as ambientações são ao estilo 2.5D, em que o jogador se movimenta com controles de tanque.

E há um motivo para tudo isso. A câmera muda automaticamente enquanto o personagem avança pelas áreas, enquadrando diferentes ângulos e planos cinematográficos. É como se Trek to Yomi usasse as próprias mecânicas de sua estrutura para destacar um foco narrativo, algo feito de forma inteligente.

Essa estética funciona muito bem na prática, mas existe um tendão de Aquiles. Os cenários são muito parecidos e sempre focados em aldeias e cidadelas destruídas, e os inimigos sempre são os mesmos, o que gera uma enorme sensação de repetitividade (apesar de existir um motivo para isso na trama).

Os cenários brincam com a iluminação (e a falta dela) com a estética em preto e branco

Além dos cenários em 2.5D, Trek to Yomi também conta com exploração. Há caminhos alternativos, que levam a coletáveis, munições e até maneiras mais fáceis de abater um grupo de inimigos à frente. A parte mais interessante é que, para encontrá-los, é necessário analisar o ambiente. Sempre há uma janela aberta, uma caverna estreita e até escadas escondidas que levam a rotas diferentes. É preciso ser criativo e ter um olho atento aos detalhes.

Embora essa exploração funcione e deixe o jogador sempre intrigado pelo que pode estar escondido em cada canto, ela acaba sendo bem limitada e não vai além disso.

Também há quebra-cabeças de ambiente, que precisam ser solucionados para avançar no jogo. No entanto, todos são fracos. As soluções são simples e repetitivas, com praticamente todos os puzzles consistindo apenas na ideia de empurrar um objetivo ou analisar três símbolos óbvios no cenário.

Uma katana para a todos governar

O combate de Trek to Yomi é simples e sempre ajusta automaticamente o cenário para uma estrutura 2D, ou seja, é possível apenas atacar pelos lados direito ou esquerdo.

Todos os duelos são focados em katanas, mas também há alguns itens limitados que podem ser usados a longa distância para quebrar um galho, como arco, bo-shurikens e até uma escopeta.

Assim que o cenário se “ajustar” à visão 2D, já espere pela aparição de inimigos

Os confrontos requerem concentração para aparar e executar combos de golpes, mas o combate se resume a isso. Todos os inimigos comuns podem ser derrotados com ataques simples, o que não incentiva o jogador a tentar estratégias diferentes.

Por exemplo, precisei apenas dominar o aparo e um combo forte que recupera vida para finalizar o jogo sem precisar mudar meu modus operandi em nenhum momento. Isso acaba fazendo o jogo perder um pouco do próprio potencial, uma vez que a maioria dos golpes são divertidos e diferentes entre si, rendendo combos mais rápidos, fortes ou precisos.

As únicas lutas em que há um pouco mais de desafio são contra os chefões de cada capítulo. Mas há altos e baixos. Alguns deles são engenhosos e divertidos, já outros… nem tanto. Então a única maneira de realmente deixar a experiência mais desafiadora é explorando os níveis de dificuldade, que são quatro ao todo.

Há ainda um detalhe pequeno em relação aos golpes, que prejudica a imersão que o jogo propõe com sua premissa. As habilidades são desbloqueadas automaticamente ao avançar os capítulos – ou seja, o espadachim não as aprende de forma orgânica na história (e nem mesmo o jogador precisa escolher o que quer, como uma árvore de habilidades). Cada golpe é habilitado progressivamente, e você é apenas notificado sobre isso com um pop-up na tela, o que quebra bastante a imersão.

Os checkpoints são pequenos santuários que carregam a vida do personagem e salvam o progresso do game

A trilha sonora segue um estilo típico oriental, que acompanha o tema do jogo e estabelece o clima de cada capítulo. Mas não se sobressai tanto quanto poderia, por se manter dentro do seguro.

O jogo conta com legendas em português brasileiro, mas dublagem apenas em japonês para manter a imersão da história. A localização está bem feita, mantendo o tom sério da narrativa, sem erros que atrapalham o entendimento.

Uma jornada para o mundo dos mortos

Trek to Yomi é um jogo que usa um conjunto de mecânicas para oferecer um foco mais narrativo que remete ao cinema antigo, mas que se preocupa mais do que deveria com essa ideia – e acaba sacrificando alguns elementos do gameplay, que poderiam ser mais engenhosos.

O título também demora um pouco para engrenar, ganhando mais profundidade e personalidade a partir do meio da história. Mas não deixa de entregar uma jornada envolvente e viciante. É aquele tipo de jogo que você não sente as horas passarem e, quando percebe, já está dentro daquele universo.

Entre altos e baixos, Trek to Yomi é uma experiência que vale a atenção, mas que poderia ter sido (muito) mais se tentasse adicionar mais ambição à forma como constrói suas ideias.


Este review foi feito com uma cópia cedida pela Devolver Digital.

Trek to Yomi está disponível para PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X|S e PC. Vale lembrar que também já está no catálogo do Xbox Game Pass.

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